Wednesday, November 26, 2008

CAPÍTULO -4 : O PROCESSO DE DEMOCRATIZAÇÃO EM MOÇAMBIQUE : QUE CONTRIBUTOS PARA A SEGURANÇA HUMANA

Os processos de democratização em Africa : Que contributos para segurança humana - o caso de Moçambique

Arão Dava

A democratização em Moçambique enquadra-se no contexto internacional dos processos de democratização iniciados no fim da Guerra Fria. Tal como afirmamos citando Picasso, (2003:67), com fim da Guerra Fria., alteraram os tradicionais interesses e a necessidade de bloquear a expansão comunista em África. Assim o colapso da URSS, a “desideologização” das relações internacionais e os avanços tecnológicos obrigaram o ocidente a reformular os seus interesses no continente.

Com efeitos terminada a Guerra Fria, os regimes de partido único africanos, tais como a FRELIMO em Mocambique, como forma de sobreviveram ao novo contexto internacional iniciam com processo de abertura política e económica realizando em primeiro lugar eleições com forma de reconquistar a sua legitimidade interna e externa para governar. E assim que em muitos Estados africanos se iniciam os processos de democratização.

Importa recordar, que como temos estado a defender, a democratização implica a passagem de um regime não democrático para o democrático. Por outro lado, a democratização e um processo que consiste no alargamento das oportunidades de contestação através de oligarquias concorrenciais e no alargamento das oportunidades de participação do cidadão na vida política, económica, social e cultural do Estado com o fim último de garantir a liberdade do medo e das carências, a paz social efectiva e o desenvolvimento. Em Africa, em particular estes processo sao influenciados tanto por factores internos como externos, tal como a seguir veremos tendo em conta, o caso moçambiano.

4.1- FACTORES EXTERNOS

O fim da Guerra Fria - O fim da Guerra Fria que significou o fim da bipolaridade político-económica do mundo e emergência da supremacia de valores ocidentais. De um modo geral esta situação produziu impactos nas Relações Internacionais que consubstanciam-se em :

- A redução legitimidade do socialismo, entanto que modelo político económico viável e da capacidade da URSS em dar apoio aos seus aliados. Estas situação fizeram com que países aliados da URSS (como Moçambique) começassem a avaliar a possibilidade de optar por novos aliados (Chabal, 1998:148).
- Criação de condições para o aumento da pressão ocidental para a implementação de reformas segundo o modelo democrático liberal. Neste quadro os doadores internacionais começam a exigir como condição de ajuda, a implementação de programas de ajustamento estrutural e reformas democráticas (Kpuendeh, 1992:2).

A ascensão e a consolidação de novas teorias explicativas do desenvolvimento - A ascensão e a consolidação de novas teorias explicativas do desenvolvimento de inspiração neoclássica que vieram influenciar à maioria das instâncias de decisão nacional e internacional. Numa altura em muitos países subdesenvolvidos debatiam-se com a crise da dívida, a alternativa foi aceitar com as condições de liberalização sem as quais não se poderia aceder aos créditos para a ajuda ao desenvolvimento. Embora esta doutrina já vigorasse e Moçambique tenha aderido as reformas ainda no período da Guerra Fria, tornou-se evidente no período pós Guerra Fria. A nova corrente de pensamento sobre o desenvolvimento de África entendia que o problema do atraso económico e social, com o qual o terceiro mundo, em geral, e Moçambique, em particular, se deparavam, não tinha outra justificação se não razões de ordem interna conjugados com uma demasiada influência de um Estado de Partido único e uma economia centralmente planificada.

Nova visão da Organização da Unidade Africana - A democratização em Moçambique e também influenciada pela nova visão da O.U.A, também resultante do Fim da Guerra Fria. De facto, com o fim da Guerra Fria a O.U.A demonstra mudanças na ênfase que dava á descolonização e começa a dar prioridade a aspectos como, liberdades políticas, recuperação económica e boa governação.

Na XXVI cimeira da O.U.A em 1990, o secretario geral desta organização continental, Salim Ahmed Salim (Kpundeh, 1992:4) manifestou-se a favor da democratização, defendendo que “África não pode ignorar o consenso global sobre os valores da democracia, mas a democracia deve ter um crescimento interno” (Kpundeh, 1992:4)[1]. No ano seguinte, em 1991, na cimeira dos chefes de estado da O.U.A (1991), o então presidente da Nigéria, Ibrahim Bambagida concentrou o seu discurso na questão da democracia. Ele defendeu que no processo de desenvolvimento, os africanos enfrentam simultaneamente os agudos problemas de reestruturação económica e criação de instituições livres e democráticas para a expressão social. Bambagida disse na ocasião aos seus homólogos que “ devem reconhecer que nos tempos actuais é preciso reexaminar o conceito e pratica do poder e liderança no continente…a democracia não e apenas uma opção atractiva mas racional….” (Kpundeh, ibid.) [2]

A queda do regime do apartheid - o aspecto mais importante a nível externo foi a queda do regime do apartheid. Com o fim da GF, o regime do apartheid já não podia mais, carregar a bandeira de anticomunismo, daí que as pressões no sentido de adopção do modelo democrático liberal tenham se intensificado. Assim verificam-se mudanças significativas a partir do novo governo de De Klerke.

Em termos de inserção internacional, De Klerk, encerrou a Total Nacional Strategy, dos "securocratas" do governo de Botha e formulou, em 1989 os princípios chave do New Diplomacy. O referidos princípios entre outros, destacavam os seguintes aspectos:

A África do Sul deveria ser uma potência regional, mas o seu Poder tinha limites.
A África do Sul dependia de relações amigáveis com os seus vizinhos.
A política regional sul-africana deveria ser implementada com instrumentos não coercivos.

Ao acabar com a sua política de desestabilização, a África do sul abria espaço para que as necessárias reformas em Moçambique fossem levadas a cabo, isto e, o Estado moçambicano deixa de sofrer pressão da Guerra passando a preocupar-se muito com outros aspectos da segurança humana como a garantia de liberdades aos seus cidadãos.

Finalmente podermos inferir que o ambiente internacional Influenciou substancialmente o processo de democratização em Moçambique. Tal como verificamos o Fim da Guerra Fria, arrastou consigo a possibilidade de opções político económicas que não fossem democráticas liberais, isto e a abriu espaço para a pressão ocidental para a democratização dos países africanos. Aliadas a este facto, estavam as teorias explicativas de desenvolvimentos que devido as experiências amargas da orientação socialista levaram a muitos países como Moçambique que viviam momentos de crise interna a se democratizarem, num processo muito influenciado pelas instituições de Bretton Woods. Tudo isto aconteceu numa altura em que em África a organização continental, O.U.A, também começar a adoptar oficialmente pela democracia como modelo. Todo este processo foi fundamental para a África do Sul, parasse de carregar a bandeira de anticomunista e se democratizasse. A democratização da África do Sul, permitiu que RENAMO e a FRELIMO sentassem a mesa de negociações e tomassem decisões importantes sobre o futuro de Moçambique como um pais democrático.

4.2 – OS FACTORES INTERNOS

O fracasso da estratégia de desenvolvimento - a nível económico o processo de democratização em Moçambique terá sido influenciado pelo fracasso da estratégia de desenvolvimento adoptada, que não conseguia responder aos problemas económicos do país.

De facto, a degradação da situação socio-económica e a crise da dívida impeliram a FRELIMO a busca de novas alianças no mundo ocidental ao mesmo tempo que a economia política internacional modificou as regras de jogo e as condições de cooperação. Uma das condições prévias para a renegociações das antigas dívidas e para o acesso aos novos créditos foi a participação nas instituições de Bretton Woods e a realização do programa de ajustamento estrutural.

No período entre 1984 e 1985, a economia moçambicana atingiu um estado de crise insustentável. O esgotamento de recursos nacionais, aliado ao facto de maior parte dos credores serem do ocidente, tornou inevitável a filiação do pais no sistema de Bretton Woods, tornando-se, em 1984, membro do Banco Mundial e do FMI. Três anos mais tarde podia começar um programa de reabilitação económica e social (Magode;1996:92).

Com efeito, depois de uma economia centralmente planificada, em 1985 dão-se os primeiros passos para a liberalização, o que leva a transição. Visando reverter as tendência negativas do crescimento económico através de um reajustamento estrutural, em 1987 é introduzido o Programa de Reabilitação Económica (PRE) e em 1990, o Programa de Reabilitação Económica e Social, (PRES). O ajustamento estrutural em Moçambique significou, a introdução do livre comércio, desregularização e a privatização. O governo liberalizou os preços, praticamente terminou a sua gestão do mercado, cortou o seu orçamento nos sectores sociais e fez mudanças nas políticas de saúde e educação.

Sem pretendermos totalmente inferir algo, podemos dizer que o tipo de ajuda que recebia e o tipo de reformas que introduziu são demonstrativos de que o país começava a ser pelo pensamento económico liberal que mais tarde viria a ser oficialmente adoptado.

Necessidade de responder a pressão interna e as mudanças internacionais – Internamente, a pressão e as distorções da Guerra de desestabilização, que tinha aniquilado todo o projecto de desenvolvimento, paralisado a actividade produtiva e promovido a incapacidade do governo de defender o cidadão contra a violência física incluindo as matanças desenfreadas.

Aquelas situações corroíam totalmente a legitimidade do Estado. A única solução seria a reconstrução económica e política em condições novas e modificadas. Tal modificação passava necessariamente pela satisfação das exigências adicionais.

Essas problemáticas levaram a RENAMO a fugir um pouco da sua natureza desestabilizadora. Nessa época Afonso Dlakama citado por Cline dizia que a sua a guerra tinha como objectivo provocar mudanças, afirmando que “...o meu objectivo é de forçar a FRELIMO a fazer alterações políticas respeitantes ao sistema democrático de governo. Quando houver uma garantia de mudança porá cobro a guerra ...” Cline (1989 :29). Segundo Lalá e Ostheimer, (2003:6-7) o governo da FRELIMO pressionado por estas exigências faz de tudo para que o Estado garantisse :

1. Direitos básicos individuais, as liberdade de crença, opinião e associação;
2. Pluralismo partidário;
3. Independência dos tribunais;
4. Eleições livres e secretas; e
5. Eleição directa do presidente da República.

Assim paralelamente ao programa de reabilitação económica foi tomada uma série de medidas com o objectivo de adaptar a constituição do país ao ajustamento e liberalização económica. Durante o seu Quinto Congresso, em 1989 a FRELIMO separou o Estado do partido e retirou as palavras Marxismo-Leninismo dos estatutos do partido. No ano seguinte, em 1990, o parlamento adopta a nova constituição, que introduz o Estado de Direito e os pressupostos incontornáveis da democracia, tais como : a separação de poderes entre o executivo, o legislativo e o judicial, a supremacia do principio de legalidade, o sufrágio universal periódico, directo e secreto, liberdade de constituição e filiação partidária e a liberdade de imprensa (Hunguana, 2006:5).

Com esta constituição, Moçambique muda do nome, passando de República Popular de Moçambique para a República de Moçambique, e o multipartidarismo é introduzido. Na constituição anterior implicava que o presidente da FRELIMO era automaticamente presidente da República, mas as nova constituição reza que o presidente da República deve ser eleito em eleições gerais.

A constituição abole pela segunda vez a pena de morte em Moçambique[3]. Ela afirma que a república de Moçambique é uma economia de mercado. Após debate na Assembleia Popular e uma adenda, o texto final diz que no âmbito da economia de mercado o Estado deverá ter uma função reguladora e promover o bem-estar social.

A adopção da constituição de 1990, veio responder a algumas destas reivindicações, dai que, o AGP assinado com a RENAMO serviu para a subscrição das reformas políticas já estabelecidas pelo governo e para o estabelecimento do quadro para a transição democrática em Moçambique criando as condições para paz e reconciliação.

As reformas políticas resultaram do reconhecimento de que a situação interna e os problemas que na altura se viviam deveriam ser solucionados dentro do fim do sistema fechado, prevalecente até 1990. Ademais, nessa altura o liberalismo político ganhava com as mudanças iniciais na URSS e, posteriormente, com o fim da Guerra Fria e a Nova ordem Mundial que ditavam a democratização, situação que o país não esteve alheio nem passou despercebido.

4.3– AS IMPLICAÇÕES DA DEMOCRATIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA HUMANA

Em primeiro lugar, a democratização é um processo que, em geral se refere a transição de qualquer outro regime para o democrático. Assim assuminos que estamos a sair de uma situacao de um regime nao democratico para o democratico. Este processo consiste no alargamento das oportunidades de contestação através de oligarquias concorrenciais e no alargamento das oportunidades de participação do cidadão na vida política, económica, social e cultural do Estado, num processo que nos ira permitir a liberdade do medo e das carências, o que significa por outras palavras o alcance da paz social efectiva e do desenvolvimento, isto e a segurança humana.

A Paz Social efectiva e o desenvolvimento humano sustentável dependem no entanto, do reconhecimento de factores tais como democracia, direitos humanos, desenvolvimento económico, sustentabilidade do meio ambiente e estabilidade militar tendo em conta o homem como referência primária da Segurança (Solomon e Cilliers, 1996:6).

Gastil (op. cit.) citado por Sitoe (2006:161) defende que nas actuais circunstâncias históricas ao contrário do período anterior a segunda metade do Século. XX, a implantação da democracia pluripartidária constitui factor base para que o país caminhe rumo a boa governação e ao desenvolvimento e consequentemente a Segurança Humana.

Isto significa que a democracia é uma condições sine qua non para o desenvolvimento, entendido como redução da pobreza e da exclusão social, económica, culturas ou política. Alias tal como já tivemos a oportunidade de afirmar Leftwich (op. cit.) citado por Weimer (2002:80) considera que existe uma correlação significativa entre um Estado Democrático orientado para o desenvolvimento e o próprio desenvolvimento sócio-económico quantitativo e qualitativo neste Estado.

Em Moçambique as reformas levadas a cabo, tanto a nível político como económico resultante das pressões internas e externas culminaram com o Acordo Geral de Paz[4], AGP, pondo fim a Guerra de desestabilização que constituía um dos factores fundamentais de segurança humana. Por outro lado, sob ponto de vista político as reformas abriram espaço para a remoção do monopólio por parte do partido FRELIMO do debate e exercício político, permitindo assim a participação do cidadão, das sociedades, dos partidos e dos meios de comunicação social antes excluídos pela sistema de governação do partido de vanguarda. Sob ponto de vista económico, as reformas trouxeram consigo a remoção do papel do Estado na economia, facto que veio a permitir que o pais se desenvolvesse de forma sustentável, com os cidadãos a participarem livremente na actividade económica. Estas reformas, aliadas ao fim da guerra, tiveram como resultado a liberdade do medo e a criação de condições para a luta contra as carências, isto é para a paz social efectiva e para o desenvolvimento.

Tal como definimos, segurança humana resulta da liberdade do medo, ou seja no alcance da paz social efectiva e da liberdade das carências, isto e, do desenvolvimento sócio económico sustentável. O processo de democratização, como o culminar das reformas, resultou nas seguintes dimensões de segurança humana :

1 – A DIMENSÃO POLÍTICO-SOCIAL - A vigência do sistema de partido único tinha criado condições para a existência de vários grupos entre os quais , os descontes da FRELIMO que tinham sido presos ou acusados, os exilados opositores da ideia de partido único, os académicos do pós-independência, que constituíam oposição e que pretendiam de alguma maneira formar os seus próprios partidos.

O processo de democratização, permitiu que nos finais da década de 80, um novo Estado fosse repensado para ser construído no estrito respeito pela lei. Neste sentido, o país deixa de ser dirigido por um regime ditatorial e passa a ser dirigido por um regime democrático. Assim, algumas realidades novas emergiram :

1. Deixa de haver uma filosofia ou ideologia exclusiva e liderante, isto é passa a ser reconhecido o estatuto específico da oposição e os governados podem optar entre vários modelos de organização da sociedade.
2. Deixa de existir um aparelho destinado a impor ideologia.
3. São garantidos de forma efectiva os direitos pessoais do cidadão
4. O cidadão participa livremente na designação dos governantes
5. Existe um controlo do exercício das funções dos governos.

A nova constituição trás um Estado de direito com poderes executivo, legislativo e judiciário a funcionar separadamente e interagindo com cidadãos responsáveis e participantes, num sistema o mais inclusivo e abrangente possível, isto è virado para o indivíduo permitindo-lhe liberdade que antes não tinha e consequentemente removendo lhe os obstáculos limitativos e promovendo uma maior segurança humana.

Por outro lado, Diogo, (2002:12) refere que com a nova constituição desenvolve-se em Moçambique um Estado não todo poderoso responsável por prestar todo o tipo de serviços aos cidadãos, mas na busca de conjugação com o lado civil de uma sociedade activa e participativa, com um debate aberto, como valioso instrumento para uma acomodação pacífica e resolução de diferentes opiniões.

A nova constituição de 1990, parcialmente ajudada pelo AGP de 1992, trouxe dois elementos fundamentais para a segurança humana, por um lado, renova o contracto social, isto é os moçambicanos juntos reconhecem que apenas um governo pode/deve ser legítimo, e por outro lado concordam que Moçambique é (deve ser) um Estado democrático liberal, independentemente dos governos (Mazula, 2000:44).

A constituição de 1990, reforçada pelo A.G.P. estabelecem regras de jogo político, no sentido de que o acesso ao poder é feita com base em eleições democráticas, tendo se assumido a democracia multipartidária como sistema político.

A democratização permitiu por um lado, que FRELIMO se legitimasse como força política dominante nas várias esferas da vida moçambicana [ é preciso recordar que a falta de legitimidade do governo provocou a rebeldia de certos segmentos da população contra o Estado provocando um conflito Estado-indivíduo]. Por outro lado, permitiu que a RENAMO e outros movimentos políticos clandestinos se transformassem em partidos políticos. Assim, os militantes e dirigentes destes partidos e movimentos políticos libertam se do medo, isto è manifestam livremente as suas opções políticas. As diferenças políticas passam a ser manifestadas no quadro da competição política nos partidos políticos, Assembleias Municipais e Assembleia da Republica (Weimer, 2002:61).

Outro aspecto importante é a descentralização pensada como resposta tanto para a melhor integração do país, como para a melhor participação do cidadão na gestão de assuntos públicos a todos os níveis. Isto permitiu trazer o cidadão para mais perto do Estado e das suas instituições (Baptista-Lundin, 2002:127)

O processo de democratização permite igualmente o surgimento da sociedade civil[5] com cidadãos a juntarem-se e a trabalharem para atingir certos fins e, ao lado das acções do Estado, alcançar o desenvolvimento do país. Estas associações estão geralmente engajadas em sectores sociais específicos e congregam, muitas vezes, ex-governantes que ao deixarem o executivo, legislativo ou outro cargo no aparelho do Estado criam ONG´s para servir a sociedade através do associativismo(ibid. - 118).

No que toca a sociedade civil, verificamos que actividades anteriormente proibidas ou vistas como de grande desconfiança são exercidas livremente e de forma aberta, levando ao surgimento de diversos movimentos e organizações da sociedade civil, ( ONG´s, confissões religiosas, autoridades tradicionais, sindicatos, organizações académicas, organizações cívico-políticas, grupos femininos, associações de direitos humanos e meios de comunicação independentes). Hoje, a sociedade civil tem promovido actividades relevantes para a consolidação da paz e da democracia. O novo cenário de abertura à sociedade civil vem quebrar uma prática de participação cívica que existia até a data somente através do canal partidário (FRELIMO), com as chamadas organizações democráticas de massas, às quais alguns cidadãos eram excluídos.

Assim, podemos inferir que, a democratização consubstanciada na nova constituição, libertou os cidadãos do medo e abriu caminho para a paz social efectiva, isto porque foi criado um novo quadro legal que possibilitava a livre manifestação política, religiosa, ou cultural. Aos cidadãos era já permitido criar partidos políticos, pertencer a qualquer religião ou manifestar-se culturalmente. A Este novo quadro político que estava entre as expectativas do cidadão como resultado da independência e que tinha sido privado pela FRELIMO contribuiu significativamente para a segurança humana. Vale a pena uma vez mais recordarmos que a privacao os direitos religiosos, politicos e cultrais constituem ameaca a seguranca humana e que a democracia e um aspecto fundamental da seguranca humana.

3 - A DIMENSÃO ECONÓMICA – Ao adoptar as reformas económicas, o Estado não só abriu a economia a agentes diversos, como libertou a iniciativa empreendedora dos agentes económicos, ficando com uma função reguladora e promotora do bem-estar social.

A introdução do reajustamento estrutural no país, através do qual o livre comércio, a liberalização dos preços de bens e serviços e as privações galvanizaram o sentido de liberdade e criação de riqueza. A passagem da economia planeada para a economia de mercado agradou a maior parte dos actores económicos, que foram reprimidos durante cerca de quinze anos. Vale a pena recordar que a guerra de desestabilização consistiu na aniquilação da produção e de outras actividades económicas, factos que viriam a aumentar o nível de desenvolvimento com impacto na segurança humana.

Todavia, o relançamento da produção através do programa de reabilitação aliado ao fim da Guerra que reanimou a actividade económica rural, que apesar de não terem resolvido os problemas de bem estar, contribuíram pelo menos para um melhor desempenho económico com impacto no nível de vida e na redução das carências, factos inequivocamente demonstrativos de uma direcção rumo à segurança humana.

Referimo-nos no principio que o colapso financeiro e economico constitui uma ameaca a seguanca humana, com o processo de democratizacao acompanhado das reformas politicas e economicas o pais tem Estado a registar assianlaveis indices de crescimento economico entre os seis e os oito porcento.

4 - DIMENSAO CULTURAL – Ao reconhecer e valorizar os direitos culturais e religiosos, a constituição de 1990 abriu espaço para que as populações se reconciliassem, perdoassem e se purificassem dos efeitos do “sistema político e económico” e da Guerra .

Depois de um relacionamento tenso e problemático imediatamente após a independência nacional, o Estado iniciou um processo de aproximação à igreja atraves da devolução dos bens anteriormente nacionalizados. O factco contribui para que a igreja se envolvesse uma vez mais em instituições de educação e saúde. Aparentemente banal, estes factos levaram a mudança de atitude das comunidades que deixaram de interpretar o Estado como seu inimigo, contribuindo consequentemente para o aumento da legitimidade do Estado e para o sentimento de maior segurança das comunidades.

Ao adoptar a política de não reconhecimento da autoridade tradicional e das suas práticas o governo da FRELIMO (logo o Estado) perdia uma das principais fontes de legitimidade, facto que fez com que muitos dos detentores do Poder Tradicional participassem activamente nas actividades da RENAMO e outros tomaram atitude neutra, apesar de a FRELIMO nunca ter sido sua simpatia. Com as reformas políticas verifica-se hoje a nível dos distritos maior interacção entre os administradores e os representantes do poder local. Além disso eles (os detentores do Poder Local) já podem exercer livremente as diferentes cerimónias tradicionais, sendo hoje inclusive reconhecida como agente de mobilização política, com vista ao aproveitamento da sua legitimidade junto das populações em benefício dos partidos políticos.

Com as reformas políticas é reconhecido o papel simbólico da autoridade tradicional, como “guardiã da terra e garante da ordem social”, especialmente nas zonas rurais.

Estes factores ajudam a reduzir o nível de descontentamento e aumentam a confiança e a satisfação das comunidades, o que ajuda a diminuir as “injustiças” e a aumentar os níveis de confiança ou de segurança humana. O mais importante nesta dimensao e a relatia liberdade das privacoes de que a populacao foi alvo.

3 – A DIMENSÃO MILITAR - Mais do que cessar-fogo, o fim do Guerra de Desestabilização significou a paz social efectiva. Para Zacarias a paz pode ter vários sentidos entre eles justiça, estabilidade, tranquilidade e ainda ausência de violência (Zacarias,1999:144 –152).

O fim da guerra e o início do processo de democratização tiverem também efeitos na gestão económica dos recursos do Estado. A economia de guerra impunha exigências de planificação e de intervenção estatal. A guerra desviou recursos necessários que mitigariam os efeitos da crise económica. A limitação material, financeira e humana impostas pela guerra diminuíram a capacidade do Estado em providenciar as necessidades básicas às populações.

De acordo com Diogo, a Guerra, durante períodos prolongados, pode induzir a moldagem da capacidade humana, de infra estruturas institucionais e de outros activos para fim especifico de guerra, levando a atrofia de outras actividades (pacificas) e que concorrem para a elevação do bem-estar. Por outro lado, no país onde decorrem operações militares ou actos de Guerra fazem se sentir os seus efeitos destrutivos directos, como por exemplo, sobre a população gerando mutilações, deslocações e mortes, rotura e negação de instituições, destruição de infraestruturas, e outros activos privados e públicos (Diogo .2002:207).

Este facto é demonstrativo de que o fim da violência (Guerra) concorre para uma melhor preocupação para a elevação do nível de bem estar, consequentemente para uma melhor busca e alcance da segurança humana.

Posto isto, podemos seguramente estabelecer uma relação de causa efeito entre o processo de democratização e a segurança humana em Moçambique. O processo de democratizacao, trouxe para alem da sobrevivência física do homem, criou condicoes para a sua sobrevivencia social, cultural, económica. Assim questoes como colapso económico e financeiro, a degradação social e ambiental, o crime organizado, as pandemias, os problemas de ordem publica, a violência interna, a corrupção, entram na agenda das possiveis ameacas que podem levar a vulnerabilidade dos individuos das comunidades e do proprio Estado. O processo de democratização veio alarga as das oportunidades de contestação e participação do cidadão na vida política, económica, social e cultural do Estado o que conduziu ao fim da guerra e ao inicio do processo de desenvolvimento. Assim, o fim das guerra e a adopcao de uma nova constituicao democratica, significou a abertura de um caminho para a seguranca humana.

4.4 - OS DESAFIOS DA DEMOCRATIZAÇÃO PARA UMA MAIOR SEGURANÇA HUMANA

A democratização é sem dúvidas uma das condições fundamentais para a Segurança Humana. Tal como nos referimos citando pesquisadores canadianos, Regeir e Whelan (2004) a Segurança Humana è caracterizada por três condições básicas:

1. É um conceito “holistico” que abrange todas as variadas fontes de insegurança individual incluindo as associadas a pobreza e a violência física.
2. Concentram-se nos direitos humanos dos indivíduos. Na verdade enfatiza o papel do governo como fonte de insegurança para os seus cidadãos.
3. Valoriza a sociedade civil como actor privilegiado, reduzindo assim, de forma implícita o papel do governo.

O respeito a estas condições básicas passa necessariamente pela consolidação democrática. Dez anos após as primeiras eleições, Moçambique pode ser caracterizado como um país onde vigora uma democracia eleitoral, com eleições regulares, livres mais ou menos justas. No entanto, a consolidação das estruturas democráticas moçambicanas tem sido continuamente posta em causa por uma cultura caracterizada por estruturas neo-patrimonias e corrupção dentro do aparelho do Estado.

Este facto, para além de possuir um impacto negativo no desenvolvimento (Segurança Humana), o qual requer instituições políticas estáveis e responsáveis, afecta de igual modo as relações entre a sociedade e o Estado, conduzindo a erosão do último - insegurança humana), (Ostheimer e Margraf, 2003: viii)[6]. O USAID (2005) descreve Moçambique hoje, como sendo

“uma democracia eleitoral, um regime monopartidario virtual, com um quadro legal sofisticado que é implementado selectivamente, uma economia nacional que transitou de um sistema socialista para um regime em que interesses políticos e empresariais estão estreitamente interligados”

Tal como afirmamos acima, a democratização e um processo e Moçambique esta nesse processo caminhando de uma simples democracia eleitoral para uma democracia consolidada. Para nós, Moçambique não esta perante um regime monopartidario virtual mas perante uma oposição e sociedade civil ainda em consolidação. Assim face a esta fragilizada oposição, assiste-se a repetidas vitorias do mesmo partido FRELIMO perante a fragilizada sociedade civil incapaz de responsabilizar os governantes perante os governados.

Em nossa opinião, o reforço da Segurança Humana como resultado da democratização (consolidação democrática) tem como maiores desafios os seguintes desafios:

1 – SOB PONTO DO VISTA POLITICO-ECONOMICO

1.1 - Promover um desenvolvimento inclusivo - Para que a democracia seja legitimada pelo povo, ela deve estar ao serviço do desenvolvimento. A propósito, L.Diamond (1990: 48) afirma que “ a democracia não será valorizada pelo povo, a menos que responde efectivamente os problemas sociais e económicos e proporcione o mínimo de ordem e justiça”.

Grande parte das populações em países em desenvolvimento como Moçambique associa a democratização com à esperança de ver melhoradas as suas condições de vida. A tendência crescente da abstenção popular nos processos eleitorais em Moçambique[7] poderá constituir um sinal da não legitimação da democracia. Se nas primeiras eleições em 1994, a participação popular foi de 77 %, dez anos depois, em 2004, a participação foi de cerca de 36 %.

O processo de promoção de desenvolvimento inclusivo em Moçambique passa necessariamente pelo combate a pobreza[8]. As privações de que sofrem os indivíduos em condições de pobreza são variadas e podem ser analisadas em várias abordagens que não opõem-se mas complementam-se[9] (Vieira, 2005:3).

Usando a abordagem de cabaz fixo, os resultados da incidência da pobreza são de 63.2 por cento. Estes resultados implicam que cerca de 11 milhões (mais de metade da população) viviam abaixo da linha de pobreza em 2003. Comparando os 61,3 % de incidência de pobreza as zonas urbanas com 64,1 % das zonas rurais poderíamos concluir que a pobreza continua a ser mais alta nas zonas rurais. Por outro lado a profundidade da pobreza afecta 25.8% da população moçambicana, sendo 25.6% nas zonas urbanas e 26.2 % nas zonas rurais.

Usando o cabaz flexível da linha da pobreza total, constata-se que em 2002-2003 a pobreza em Moçambique é de 54,1 %. Tendo em conta esta abordagem constatamos que cerca de 10 milhões de pessoas ainda são pobres. O índice da profundidade da pobreza é de 20.5 %.

A situação mais grave da pobreza de Moçambique è que, embora o crescimento económico seja sólido, a abrangência e transparência do orçamento, planificação e a definição do orçamento a médio prazo são fracas e a execução do orçamento, bem como a contabilidade e a prestação de contas apresentam graves deficiências o que põe em causa o combate a pobreza (USAID, 2004).

1.2 - Proporcionar a resolução dos conflitos de interesses políticos e económicos - O Poder Político é um meio muitas vezes usado (nos países em desenvolvimento) para o acesso ao poder económico. Segundo o USAID (2005), em Moçambique os líderes do mundo dos negócios procuram aumentar a sua riqueza através de laços estreitos com a FRELIMO e também procuram influência e poder para si. Os dirigentes políticos tem amplas oportunidades de enriquecerem através de seus cargos oficiais devido a existência de leis incipientes sobre o conflito de interesses e a fiscalização limitada dos processos de aquisição do Estado.

Devido ao sentimento de privação relativa, a democratização em alguns aspectos continua a não proporcionar a segurança humana necessária. Tal como tivemos a oportunidades de nos referir citando Festinger (1962 :262) a privação relativa constitui o fosso entre, por um lado, o que consideramos como sendo nosso direito ter, fazer, ser e por outro lado a nossa percepção sobre aquilo que outras pessoas, grupos de pessoas ou instituições nos permitem em termos de recursos e capacidades para satisfazer aquilo que assumimos como sendo nosso direito. A expectativa dos Moçambicanos era de que sua vida iria melhorar com o processo de democratização. Embora reconheçamo que a democratização seja um processo, achamos que o alargamento das oportunidades desenvolvimento do indivíduo devem ser aceleradas. Estas oportunidades não deverão se limitar na constituição, mas resultar na melhoria do bem estar do cidadão - objecto referencial de segurança -, isto e, o cidadão independemente da sua origem, filiação política, religiosa ou cultural deve ser beneficiário do processo de desenvolvimento ou seja deve gozar das mesmas oportunidades de desenvolvimento. Deste modo o processo de democratização estaria a resultar na segurança humana, na medida em que o cidadão estaria livre das carência.

2 - SOB PONTO DE VISTA POLITICO-SOCIAL

2.1 - Desenvolvimento de uma cultura nacional de confiança política - o que significa por outras palavras, promoção de uma cultura de confiança entre os intervenientes políticos nacionais no sentido de as eleições serem em primeiro lugar credibilizadas pelos próprios intervenientes tanto do partido no Poder, através da transparência, como da oposição, através da aceitação dos resultados.

A cultura política não se limitará na aceitação dos resultados, mas deverá ter em conta os elementos centrais da democracia (concorrência e participação), a tolerância mútua dos intervenientes, a vontade dos principais actores em assumir compromissos, a capacidade dos partidos em formar coligações e a aceitação dos resultados das eleições por parte do(s) derrotados(s).

A cultura política deverá significar o combate a certos elementos tradicionais, como a corrupção, “o favorecimento” e a politização das regiões, que constituem entre outros, elementos integrantes de uma cultura política que originam um impacto negativo em qualquer processo de democratização. Embora as sucessivas eleições tenham sido sempre declaradas “livres e justas” , elas são geralmente caracterizadas por problemas como(Lalá e Ostheimer, 2003:49):

1. Disponibilização tardia dos fundos para a campanha eleitoral, a cobertura jornalísticas tendenciosa;
2. Uso de recursos do Estado por parte da FRELIMO
3. Problemas técnicos durante a contagem dos votos, reclamação dos resultados por parte da RENAMO (excluindo as eleições autárquicas de 1998, as quais RENAMO boicotou) (Lalá e Ostheimer, 2003:49).

2.3 - Desenvolvimento de uma cultura de transparência e responsabilização na governação - A democratização deverá ser acompanhada pela cultura de transparência, responsabilização e integridade. Em Moçambique, a responsabilização do governo perante os cidadãos e perante a lei não é suficiente, uma situação é facilitada pela falta de uma fiscalização independente, por uma política acima da lei e pela falta de transparência.

Embora existam algumas leis e mecanismos no papel, que constituem o quadro para a boa governação, na prática existem ou funcionam poucos mecanismos de controlo para que este quadro funcione de forma honesta, transparente e para o bem do público (USAID, 2006).

A falta de transparência na governação e a fragilidade relativa da sociedade civil, da incapacidade de os cidadãos comuns responsabilizarem o governo que se sente mais responsabilizado pelos doadores dos quais depende do que dos cidadãos constituem obstáculos à governação.(USAID, ibid.).

A falta de transparência e responsabilização remete o Estado ao perigo de "favoritismo", "patrimonialismo", "clientelismo", tráfico de influência, burlas e a corrupção (Mosse, 2004). O nível e o âmbito da corrupção em Moçambique constituem motivo de alarme. constituindo um sintoma das fragilidade a nível democrático e de governação. Esta fragilidade amplifica uma ameaça que tem potencial de minar o progresso futuro do desenvolvimento do pais. Consequentemente, o governo democrático e o progresso de Moçambique estão em risco (USAID, 2005), já que apesar das varias instituições de combate a corrupção terem sido criadas – Gabinete de combate a corrupção, Unidade anti-corrupcao, nenhum ou quase nenhum caso de destaque teve desfecho.

Nos últimos vinte anos, a corrupção tende a alastrar-se em Moçambique, tendo agora atingido todos os sectores, funções e níveis do governo. Segundo Mosse (2004) no anterior regime, (ate finais da década de 80) em Moçambique a corrupção não era tolerada e a liderança política era vigorosa na punição dos que abusavam do bem público, possibilitando altos níveis de condenação moral, mesmo apesar dos fracos salários na função pública e uma carência generalizada dos bens de consumo de primeira necessidade.

Dados do World Bank Institut (Instituto do Banco Mundial ) revelam que o controlo da corrupção em Moçambique em 2000 era de 46,8 % ( pior do que a media mundial de 29, 8 %), tendo passado em 2004 para 24, 6 %. Moçambique é também um dos piores a nível da região, da media regional de controlo de 30 % Moçambique situa se nos 24, 6 %. Estes dados revelam uma tendência negativa em direcção a uma corrupção mais enraizada em Moçambique[10].

2.4 - O HIV/Sida - A HIV-SIDA, constitui uma ameaça grave para a Segurança Humana, se tivermos em conta que ela afecta os mais precioso recurso de que o país dispõe: o homem. No contexto moçambicano o grau de propagação bem como o estágio de maturidade da pandemia podem providenciar uma explicação provável. Embora não haja consenso entre economistas sobre o nível económico exacto da pandemia do HIV-SIDA, há concordância geral sobre a importância da dimensão temporal. Os óbitos e os efeitos de SIDA acumulam com o tempo, gerando um peso crescente e gradualmente reduzidas taxas de crescimento (IAF, 2002-2003).

Num estudo que examina as perspectivas de crescimento económico para Moçambique, Arndt (2003) estima reduções médias no crescimento anual per-capita entre 0.3 e 1.0 no período de 1997-2010. Porém, implicações são ligeiras até a primeira metade do período (até 2003) e mais profundas na segunda metade (2003-2010). Para maioria das províncias ainda não passou o tempo suficiente para que os efeitos económicos sejam reconhecíveis (Arndt, 2003) .

Mesmo nas províncias centrais onde estimativas demográficas disponíveis indicam que a pandemia já atingiu um estado avançado de maturidade, e onde a projecção do número de óbitos da SIDA tem estado a aumentar rapidamente nos anos antes de 2002-2003 ( e nos anos imediatamente a seguir) o número de óbitos acumulados, é relativamente baixo, comparado à projecção para 2010 (INE, 2002).

A economia poderá declinar devido aos custos resultantes das diferentes intervenções na luta contra o SIDA. O impacto social e económico da epidemia vai continuar até um período superior a dez anos mesmo que a infecção pelo vírus desta epidemia fosse interrompida hoje (PEN de combate as DTS/HIV/SIDA, 2000-2002)[11].

2.5 - O Analfabetismo - Entre pessoas com mais de 15 anos, 53, 5 % eram analfabetas em 2002 (PNUD, 2004) das alfabetas, somente 4 por cento tem formação universitária e a maior parte, mora na capital Maputo.

Os serviços educacionais são ineficientes principalmente para quem vive nas zonas rurais. A falta de material escolar (livros, cadernos, e esferográficas), a ausência de professores e as insuficiências tornam impossível o acesso a educação. Embora o ensino primário básico tenha sido declarado gratuito, tem havido cobranças de taxas com pretexto de manutenção e da acção social da escola. Como resultado, quase metade das crianças em idade escolar está fora do sistema de educação.

Em dois mil e quatro, 60 % das crianças ingressaram no ensino primário, porém somente, 52 % chegaram a quinta classe (PNUD, 2004).

Embora as oportunidades de contestação através dos partidos políticos seja constitucionalmente possível, o sistema esta bastante bipolarizado pela FRELIMO e RENAMO, que se vem mais como inimigos do que adversários.. Estas duas formações políticas monopolizam a governação desde o topo ate a base da governação privando vários extractos da sociedade da participar na vida político-social e económica do Estado. Esta situação e agravada pelo facto de as diferenças que conduziram a guerra entre os ex-beligerantes continuarem a dominar a agenda política dos dois maiores partidos em detrimento do cidadão, que acima nos referimos como objecto referencial de segurança. Face a este cenário, estamos perante uma sociedade civil, ainda frágil que não consegue impor uma cultura de responsabilização aos governantes.

Esta situação e agravada pela fragilizada sociedade civil que não consegue impor uma cultura de responsabilização perante os governantes.

3 - SOB PONTO DE VISTA POLITICO-CULTURAL

3.1 - Gestão da diversidade cultural – compreender, analisar e melhorar a gestão das diferenças culturais, sociais e políticas e resolver o “ potencial conflito de lealdade” do indivíduo ao Estado e a Comunidade, são hoje desafios fundamentais e essenciais para reduzir a insegurança. A lealdade a família alargada e não o Estado, continua a providenciar o sistema básico de segurança em alguns casos resultando em comportamentos nepotismo, favoritismo em prejuízo do Estado (USAID,2005).

Para além da universalidade de certos princípios, estas formas tem que ser enriquecidas por aspectos culturais específicos para contribuir para a formação do Estado e logo para a Segurança Humana(Mazula, 1994).

De acordo com Baptista-Lundin (2002:114-115), numa situação de diversidade cultural a nação não existe para todos na totalidade do território nacional, ela adquire em cada todo cultural um aspecto de diversos elementos. E sendo assim, os indivíduos emprestam a lealdade primária às comunidades onde esta cultura lhes estrutura como indivíduos. Neste todo complexo para se construir um Estado sólido, estável e unitário, o poder da governação deve ser exercido dentro de parâmetros que, seguindo contornos universais, sejam reconhecidos como seus e apropriados equitativamente, por todos os indivíduos do território nacional.
Para Moçambique isto implica o reconhecimento do papel simbólico desempenhado pela autoridade tradicional como “ guardiã da terra e garante da ordem social” nas zonas rurais

O desafio do Estado será o de aproximar-se cada vez mais da autoridade local sem transformar uma chefia comunitária em agente do Estado. A experiência colonial com os régulos mostra-se mais negativa que positiva, criando fissuras no seio das populações no entanto as suas negação foi também usada para a desestabilização entre 1976 a 1992 (Baptista-Lundin, 2002:114-115).
As autoridades locais são vistas pelas comunidades como os promotores e guardiaos de segurança, independentemente da vontade do Estado. O Estado sairia mais a ganhar com o reconhecimento do poder dos lideres locais do pela tentativa de destruição ou exclusão. Através destes micro poderes os cidadãos das comunidades teriam nas comunidades uma forma de participação político, económica e cultural e garantindo deste modo a sua segurança humana.
[1] “…Africa could not ignore de global consensus on the value of democracy, but democracy must be home grown”.
[2] “… must recognize that the time has now come to re examine the concept and practice of power and leadership on our continent …democracy is not only an attractive option but a rational one.”
[3] A FRELIMO aboliu a pena de morte aquando da independência em 1975, entretanto ela voltou a ser introduzida alguns anos depois, com a justificação de que a evolução da guerra e a criminalidade económica assim o exigiam Boletim AIM, Abril 1983 Maputo.
[4] Entre 1990 e Outubro de 1992 decorreram em Roma negociações de paz com assistência do governo italiano. Em Agosto de 1992, apôs um encontro em Roma, o presidente de Moçambique, Joaquim Chispando e o dirigente da RENAMO, Afonso Dlakama numa declaração conjunta, deram instruções no sentido de se chegar a um acordo de paz. O AGP viria a ser assinado no dia 4 de Outubro de 1992, em Roma. Foi estabelecido o dia da entrada em vigor do cessar-fogo, como sendo o dia da adopção pela Assembleia da República, do AGP, incorporando-o na lei moçambicana. Nestes dia iniciaria o desdobramento dos efectivos da ONU no território moçambicano para a verificação do cessar-fogo.

[5] Segundo, Chabal (1994 citado por Baptista-Lundin 2002:117), sociedade civil consiste no que não é parte do Estado, mas também nos que se tornaram sem poder ou sem direitos. Não somente aldeões, pescadores, nómadas, membros dos diferentes grupos de idades, conselheiros de povoações e os moradores do caniço, mas também os profissionais, os políticos, padres, pastores, mullahs, intelectuais, oficiais militares e ainda todos os são ou se sentem sem acesso ao Estado.

[6] In Lalá e Ostheimer (op.cit).
[7] Dados oficiais revelam que nas primeiras eleições gerais de 1994, a abstenção foi de 13%, as primeiras autárquicas, 1998, 85%. Segundas eleições gerais, 85%. Segundas eleições gerais, 1999, 30.49, segundas eleições autárquicas 75%. Nas eleições gerais de 2004 63%.
[8] O Plano de Acção Para a Redução da Pobreza (PARPA I) adoptou o termo pobreza para se referir a incapacidade dos indivíduos de assegurar para si e os seus dependentes um conjunto de condições básicas mínimas para a sua subsistência e bem estar, segundo as normas da sociedade.

[9] Existem várias outras definições que mais abrangentes que é preciso ter em conta : Pobreza Absoluta ou Extrema – falta de rendimentos necessários para satisfazer as necessidades básicas, ou requerimentos calóricos mínimos; Pobreza Relativa – Falta de rendimento suficiente para satisfazer necessidades alimentares e não alimentares essenciais, de acordo com o rendimento médio da sociedade; Pobreza humana – falta de capacidades humanas básicas, como analfabetismo, má nutrição, esperança de vida reduzida, saúde materna fraca, incidência de doenças preveníveis, com medidas indirectas tais como acesso a bens, serviços e infra-estruturas necessárias para atingir capacidades humanas básicas – saneamento, água potável, educação, comunicações, energia, etc.

[10] Quanto menor o controlo pior serão os níveis de corrupção
[11] Plano Estratégico Nacional de Combate às DTS/HIV/SIDA em Moçambique, para o período 2000-2002

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